DEPOIS DA ENTREVISTA
Há pouco, ouvi Clarice. A Lispector. Mistério transbordante
em si mesma. Voz intensa a revelar subterrâneos incontáveis.
A entrevista, marcada
por suspiros e pausas, me trouxe incômodo. Algo ali não se expressava
inteiramente. Um corte contínuo, talvez uma dor pendurada nos olhos enviesados da
escritora, uma timidez afluindo indiferente.
Em concha, acomodava-se
à própria substância, enquanto o entrevistador tentava habilmente recuperá-la
no instante. Ela, no entanto, resistia à entrega – o seu único nexo.
Uma entrevista sempre
nos cede algo revelador, uma ponta de véu que se levanta e nos lança perplexos
às possibilidades. (Explosão)
Escutá-la, em seus (des)concertos,
trouxe-me a este texto, que construo sob pulsão. Porque há algo, em Clarice,
que nos tira da superfície e nos move a mergulhos de sentidos, olhares,
vivências.
As palavras se unem
para adiante sugerirem um sentido. Sem cerimônia, dou-lhes passagem.
Não sei exatamente
aonde vou chegar. Nenhuma direção é-me dada de pronto. Tudo é mutável. Nada
descubro deste percurso, se não correr riscos – eis uma certeza. Por isto, a
página é uma oferenda a confrontar meus medos. Debruço-me nela. Colho seus
segredos e os cochicho, em seguida, às entrelinhas que me apoiam.
Enquanto o texto verte, dou-me conta da construção e seu arcabouço, de seus patamares de relevância. E, ainda assim, sigo ensimesmada, mas constante.
Em que momento da entrevista o feitiço foi lançado, que palavras ou silêncios me arremessaram de mim são questões que não desvendo. Nem quero. Apenas sigo pelas mãos de Clarice.
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